segunda-feira, 8 de abril de 2019

é...
ei, 
ei você aí, 
você, 
que tem medo de si, 
você, 
que teme ser gente,
você, 
que já não acredita 
que seja 
uma pessoa, 
que tem medo 
da sua própria força. 

é...
ei, 
ei você aí, 
você mesmo, 
que acredita 
nas promessas do tempo, 
da rotina, 
e nas equações. 

e que no fim do dia 
se confirma 
a sina já conhecida, 
o destino já esperado. 

você, 
que acha 
que tudo se resolve, 
se dissolve, 
nesse labirinto, 
ao abrir a próxima porta.

você, 
que pensa 
que aquele anseio, 
aquela angústia, 
se dissiparão 
ao alcançar 
a próxima conquista. 

você, 
que se abrevia 
na lei já manuscrita, 
na palavra já estabelecida, 
na firmeza dos pilares 
e na certeza 
da consistência 
do chão 
já pisado. 

você, 
que já se acostumou 
com a comida fria, 
em se esquecer 
que existe um pôr-do-sol 
no fim do dia. 

você, 
que vive nessa trincheira, 
acredita que é uma muralha, 
uma fortaleza. 

você, 
que acha
que pode abrir o noticiário, 
consumir certeza, 
e encontrar uma sabedoria 
que seja eternamente certeira. 

você, 
que veste a carapuça 
e a fantasia 
com a serenidade 
que seja a cura 
por não alcançar
a maturidade
já convencida, 
já cristalizada. 

você, 
que debanda
para o outro lado 
da linha, 

para a outra margem 
que beira esse oceano, 
para a beleza do horizonte 
do seu lado da fronteira. 

eu ainda posso ver você, 
posso me encontrar, 
posso me perder, 
me remendar, 
me achar, 
me desfazer, 
me encarar, 
me despedaçar, 

ser o lado 
mais torto, 
mais incerto, 
mais bonito, 
mais doido, 
em você, 

mesmo que eu 
não seja 
você. 

mesmo que você 
seja eu, 
se pareça 
tanto comigo, 
quando finge,
quando finjo,
dissimulo,
não ver, 
não perceber,

tantos medos, 
tantos receios, 
tantos achados,
tantos perdidos, 
tantos incômodos, 

inquietos, 
pensamentos,
costumes,
sentimentos, 
promessas, 
crenças, 
expectativas,

que um dia 
não seja, 
o que sou, 
o que agora é.

que um dia 
exista futuro 
em não saber 
quem é.

que a gente 
possa ser 
muito mais 
do que já 
se sabe, 
do que já é 
constituído, 
convivido, 
definido, 
estabelecido, 
cristalizado, 
conhecido,
amadurecido, 
esperado.    

Nenhuma palavra rima, 
nenhum som dentro do tom.

Nenhuma oração 
que acalme o coração. 

Nenhum conselho 
que me torne mais sábio, 
ou não. 

Nenhum livro na estante 
que seja a passagem 
para a verdade secreta. 

Nem a quarta dimensão. 

Ou entre as palavras 
miúdas 
e quase não escritas, 
o encanto pela beleza 
do mistério. 

Nem o mau e o velho hábito. 

Nem os maus e velhos amigos, 
nem o gosto amargo já conhecido. 

Nem o futuro glorioso, 
nem o orgulho saudoso, 
nenhuma forma de abrigo. 

Nem sair por aí 
sem saber 
qual será o destino. 

Tudo isso, 
nada disso. 

Nada me prepara 
para a tua alvorada, 

Para quando 
em mim
você amanheceu.

Para quando 
pousou em mim 
quando anoiteceu. 

Para quando 
a tua lágrima caída 
quando distraída 
tocou a minha face. 

Você atraída 
pelo sonho meu, 
pelo sonho teu, 
pelo sonho conjugado 
a dois. 

Nada me prepara 
para quando seus olhos 
estiveram comigo. 

Eu estava apenas ali 
quando ao fim da tarde 
a luz do sol 
tocou teus lábios, 
fios de cabelo seu. 

Nada me prepara 
para o momento 
em que a encruzilhada 
nos encarava. 

Deixei as chaves 
da nossa casa assombrada, 
a mobília e os ecos 
da presença dos fantasmas. 

Tudo isso 
que me lembra 
o desejo 
que sinto 
por você. 

De saber 
quem você é. 

Eu já não sei 
quem sou.

Eu já não lembro 
quem era 
antes de abrir 
e deixar aberta 
a porta
pela qual você entrou:

- esteve aqui, 
esteve assim, 
tão perto de mim. 

Agora só o hálito 
sorrateiro 
da madrugada. 

Arco-íris submerso 
na penumbra, 
em alguma onda da neblina. 

Não tenha medo, 
já sei o caminho, 
já conheço o abraço 
da escuridão. 

Muito antes, 
pouco antes, 
de alcançar 
a próxima estação. 

Quero que você saiba 
que te agradeço 
pelo calor vivido 
do tempo presente.

Pelo futuro sonhado.

Por me lembrar 
o que é 
não sucumbir 
ao medo 
de se deixar ouvir, 
se permitir, 
o toque incerto e preciso da voz do próprio coração

quarta-feira, 3 de abril de 2019

Eu tenho medo
que o passado volte,
outra vez,
novamente.

Eu tenho medo  
que o futuro 
se afaste:

- siga, 
escorra, 
desça, 
pelos buracos do ralo. 

Não quero 
que o destino 
nos alcance
nesse instante.

Agora vou tentar...
...sem medo.

Pela grande avenida 
vou atravessar a multidão,
abraçar o abismo
sem temer o horror
da neblina enraivecida
que envolve
a hora absurda da madrugada, 
que desperta 
a angústia 
e a ira.

Onde é que foi parar, 
por onde caminha, 
a chave, 
a porta, 
o solo, 
o teto, 
a parede a rebocar, 
do ninho 
quase seguro 
do teu coração?

Não temos o tempo, 
tememos o medo, 
sem medo temos 
um coração...
...será?

Alguém viu saltar, 
pular, sorrir, 
brincar por aí 
um coração?

Acho que é ar 
o assopro que sinto
por esse buraco
que se tornou 
paradeiro 
dentro do peito. 

Eu tenho medo, 
não temos tempo, 
onde é que foi parar 
o futuro?

Temos o coração 
para seguir...
...será?

Acho que foi por ali, 
pelo buraco, 
pelo ralo. 

Agora o passado, 
outra vez, 
novamente.

 dentro da caixa  tem lápis de cor fora da caixa  existem cores  no céu na água do rio  na onda do mar  no arco-íris  no brilho  da íris  de...