terça-feira, 16 de novembro de 2021

 escrevi tanto 

a palavra vida

e tão poucas vezes

a palavra morte. 


agora 

me pergunto 

se foi por medo. 


quando somos 

novos e jovens

e a gente se sente

novos e jovens 


a morte é um instante 

longe, 

distante.


quando alguém morre

lentamente 

no mesmo tempo 

em que o cabelo cresce 

e um fio de cabelo fica


na escova de cabelo, 

na pia do banheiro, 

na fronha do travesseiro, 


a gente 

pode dizer 

que a gente

já esperava. 


e assim a dor 

parece menor, 

parece que dói menos. 


quando é de repente, 

de supetão, 


pode até parecer 

mentira, 


ou não dá 

para acreditar 

que a palavra morte 

encontrou a morte 

naquela pessoa

em toda sua realidade. 


falar 

não é igual a escrever. 


ver 

não é igual a imaginar. 


viver 

não é igual a pensar. 


lembrar 

não é o mesmo 

que sonhar. 


lentamente, 

ou de forma repentina, 

cada morte é única, 

cada gente sente diferente. 


um beijo na testa, 

uma mão sobre a outra. 


não querer ver 

para ver 

se a realidade muda.


se fica diferente 

se a gente 

não acreditar 

nessa 

que se apresenta

agora. 


de preto, 

de chinelos, 

descalço, 

de gel,

ou despenteado. 


em silêncio, 

de olhos fechados, 

com os olhos abertos 

e a alma ferida 

e escancarada: 


- o luto 

existe para quem?

para quê?


é proibido o riso?


é preciso 

tomar cuidado

com o excesso 

de lágrimas?


o pulso 

está mais 

acelerado?


e o coração?

será que sai do lugar?


as chaves ficaram onde?


do lado de dentro?

do lado de fora?


e ele que morreu

vai se lembrar

da última dança, 

ou da última briga?


o luto é pra gente, 

pra gente sentir 

esse breve nocaute, 


deixemos a morte 

e a pessoa morta

em paz. 


talvez a gente se lembre 

de quando a gente 

e ele 

ainda compartilhávamos vida. 


talvez tenha sido 

até antes que a morte 

o tenha encontrado.


ou talvez

nem tenha acontecido. 


esse poema

é pra falar da morte,

ou da vida?


não é só a vida, 

a morte 

também deixa 

a sua semente.


o luto é pra gente,

que ainda vive, 

deixemos a morte

e a pessoa morta 

em paz.


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